PL 1581/20, Bolsonaro perdoou somente as igrejas?

Muitos jornais falaram bastante sobre o assunto. Todavia, induziram o povo ao erro. Vamos traduzir!

 

O Deputado Federal Marcelo Ramos propõe o Projeto de Lei (PL) nº 1581, de 2020, para facilitar a realização de acordos que envolvem precatório e débitos judiciais da Fazenda Pública - mediante concessão de descontos e possibilidade de pagamento parcelado -, prevendo-se que os montantes economizados pela Administração em tais transações serão destinados ao combate da pandemia do COVID-19. O intuito da medida era facilitar o pagamento dos débitos tributários e multas com descontos de até 40% de todas as pessoas jurídicas que pagam a Contribuição sobre Lucro Líquido (CSLL). Então, a ajuda seria diretamente a empresas que neste momento de pandemia perderam seu equilíbrio financeiro e para não ficarem insolventes se criou esse mecanismo de auxílio. É comumente no país o uso de renúncia fiscal ou outras medidas de postergação da dívida para ajudar empresas continuarem no mercado. 



Na tramitação do PL na Câmara dos Deputados, o Deputado Federal David Soares propõe a Emenda 1 para alterar do art. 4º da Lei nº 7.689, de 15 de dezembro de 1988. Ficaria com a seguinte redação:

"Art. 4º São contribuintes as pessoas jurídicas estabelecidas no País e as que lhe são equiparadas pela legislação tributária, ressalvadas as vedadas na alínea 'b' do inciso VI do caput do art. 150 da Constituição Federal, na forma restritiva prevista no § 4º do mesmo artigo. Parágrafo único. Conforme previsto nos arts. 106 e 110 da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 (Código Tributário Nacional), passam a ser consideradas nulas as autuações feitas em descumprimento do previsto no caput deste artigo, em desrespeito ao disposto na alínea "b" do inciso VI do caput do art. 150 da Constituição Federal, na forma restritiva prevista no § 4º do mesmo artigo. (NR)".

O objetivo era que os Templos também pudessem ser beneficiados por essa norma. Tanto a Câmara dos Deputados como o Senado Federal aprovaram a Emenda, inclusive com o apoio de Deputados da oposição. Perceberam que na pandemia todos necessitam de ajuda, inclusive os templos religiosos (pastores, padres etc).


Nas mãos do Presidente da República a Emenda 1 foi vetada com o seguinte fundamento:

"Apesar de entender meritória e concordar com a propositura legislativa, ao afastar a incidência da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) sobre os templos de qualquer culto, bem como prever a nulidade das autuações realizadas de forma retroativa, estendendo a imunidade tributária prevista no art. 150, VI, 'b', da Constituição da República, por meio do caráter interpretativo da norma proposta, percebe-se que não foram atendidas as regras orçamentárias para a concessão de benefício tributário, em violação ao art. 113 do ADCT, art. 14 da Lei Complementar nº 101, de 2000 (LRF) e art. 116 da Lei nº 13.898. de 2019 (LDO), podendo a sanção incorrer em crime de responsabilidade deste Presidente. Outrossim, o veto não impede a manutenção de diálogos, esforços e a apresentação de instrumentos normativos que serão em breve propostos pelo Poder Executivo com o intuito de viabilizar a justa demanda". 

Nas razões do veto, desde o início, o Presidente concordou no mérito com a proposta. O veto ocorreu por VIOLAÇÃO do  art. 113 do ADCT, art. 14 da Lei Complementar nº 101, de 2000 (LRF) e art. 116 da Lei nº 13.898. de 2019 (LDO). O que essas normas dizem? Vejamos: 

ADCT, art. 113. A proposição legislativa que crie ou altere despesa obrigatória ou renúncia de receita deverá ser acompanhada da estimativa do seu impacto orçamentário e financeiro. 
LRF, art. 14. A concessão ou ampliação de incentivo ou benefício de natureza tributária da qual decorra renúncia de receita deverá estar acompanhada do impacto orçamentário-financeiro no exercício em que deva iniciar sua vigência e nos dois seguintes, atender ao disposto na lei de diretrizes orçamentárias e a pelo menos uma das seguintes condições: I - demonstração pelo proponente de que a renúncia foi considerada na estimativa de receita da lei orçamentária, na forma do art. 12, e de que não afetará as metas de resultados fiscais previstas no anexo próprio da lei de diretrizes orçamentárias.  
Lei nº 13.898, art. 116. Somente será aprovado o projeto de lei ou editada a medida provisória que institua ou altere receita pública quando acompanhando da correspondente demonstração da estimativa do impacto na arrecadação devidamente justificada.

Os dispositivos acima - citados na fundamentação do veto - enunciam que renúncia de receita DEVERÁ estar acompanhada de estimativa do impacto orçamentário-financeiro. A consequência do seu não cumprimento é um dos motivos da Constituição da República para o pedido de Impeachment. Logo, não era a questão de mérito que fazia o Presidente discordar, foi a ausência de demonstrativo da estimativa do impacto na arrecadação. Foi uma questão puramente técnico-jurídica.

Sabe-se, por meio da grande mídia, que Sua Excelência, o Presidente pediu que fosse derrubado seu próprio veto. Ele fez isso? Mudou de ideia? O que aconteceu na realidade? O que fez o Presidente pedir a derrubada do veto que fez foi a aprovação do Parecer do Deputado Federal Fábio Trad que continha a seguinte indicação:

"Não há óbices, pois, à admissibilidade financeira da matéria, em especial por conta da vigência do estado de calamidade pública, reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 2020. A EC nº 106, de 2020, institui regime extraordinário fiscal para enfrentamento de calamidade pública decorrente de pandemia. A proposição atende às exigências da sobredita Emenda Constitucional, que afasta a exigência de demonstração de adequação orçamentária em relação à expansão de programas destinados ao enfretamento da crise causada pelo novo coronavírus (Covid-19), desde que não sejam criados compromissos de natureza permanente".

O "x" da questão era o acompanhamento do demonstrativo de adequação orçamentária. Só que conforme leitura atenta do parecer, o Decreto Legislativo nº 6, de 2020 afastou a EXIGÊNCIA do demonstrativo desde que não sejam criados compromissos de natureza permanente. Seguiu-se nessa linha também o entendimento do Senado Federal. Não podendo se olvidar que o Presidente disse ainda que "o veto não impede a manutenção de diálogos, esforços e a apresentação de instrumentos normativos que serão em breve propostos pelo Poder Executivo com o intuito de viabilizar a justa demanda". É cediço que o interesse do Presidente era contribuir para que a Emenda fosse aprovada, só  queria ter segurança jurídica para que não descumprisse a Lei de Responsabilidade Fiscal.

O veto foi derrubado com expressiva votação nas duas Casas Legislativas. Só para não ficar nenhuma questionamento, alguém poderia dizer: mas a imunidade tributária dos templos religiosos é apenas de impostos, logo CSLL não pode abarcar a imunidade. Ouso discordar pelo simples fato de estarmos tratando de imunidade Constitucional. O que se diz com a norma, é que haverá renúncia aos templos religiosos neste período de pandemia como em todas as empresas ou setores que pagam o CSLL. Ao fim é uma questão de isonomia. A norma, portanto, foi direcionada às empresas, e refletiu-se que poderia ser estendida as entidades religiosas. 

Na prática, então, as empresas e as igrejas vão parar de pagar CSLL? Não. Serão auxiliadas neste período de calamidade assim como ajuda do Governo Federal: aos Estados, ao DF, aos Municípios, ao povo. Após, retornaremos a vida normal (se Deus quiser!) e todos voltaram a pagar integralmente seus tributos, suas multas e/ou suas dívidas (Estados, DF e Municípios) ao Governo Federal.

Enfim, fizeram uma tormenta num copo de água. A mídia sensacionalista não impede que tomemos ciência nos sites oficiais das Instituições Democráticas.

Obs.: Foram incluídas várias Emendas ao PL tanto na Câmara quanto no Senado Federal, umas mantidas outras excluídas - assunto para outra oportunidade. Norma gerada: Lei nº 14.057/20.

Acesse este link para maiores informações: Veto Presidencial

Um comentário:

  1. Muito bem colocado Dr.Edvan

    A imprensa massificadora não expõe os fatos
    Porém, devemos intensificar as postagens sobre qualquer conteúdo que envolvem nossas políticas e nosso direito democrático em ter acesso a verdade .

    Vamos trabalhar na estrutura do Blog para se tornar mais intuitivo para com os demais usuarios.

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