ADPF 701, Medida Cautelar deferida. Quais os fundamentos?

Há questionamentos em vários locais do mundo acerca da proibição total dos cultos religiosos. A questão não é apenas sanitária, mas do papel da igreja na pandemia. Percebe-se que os reflexos do fechamento das igrejas não são razoáveis e no fim acabam prejudicando o trabalho espiritual e social das igrejas nesse momento tão difícil. A fé e a comunhão são fundamentos que trazem esperança, cura e consciência de que precisamos enfrentar os desafios com equilíbrio, prudência e coragem.

Assim, não reconhecer o papel da igreja é desprezar o fundamento mais importante das democracias ocidentais.
A solução jurídica possível para questionar esses atos normativos de proibir os cultos chama-se Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) apreciada pelo Supremo Tribunal Federal. A ADPF é um instrumento processual que evita violação a preceitos fundamentais previstos na Constituição Federal. Há atualmente três ADPFs que questionam o fechamento dos templos religiosos: 701, 810 e 811.


Neste fim de semana, o Ministro Nunes deferiu liminar na ADPF 701, proposta pela Associação Nacional de Jurista Evangélicos (ANAJURE) para que os Estados, Distrito Federal e Municípios se abstenham de editar ou de exigir o cumprimento de decretos ou atos administrativos locais que proíbam completamente a realização de celebrações religiosas presenciais, por motivos ligados à prevenção da Covid19 e impôs algumas restrições. Basicamente o Ministro Kassio Nunes Marques (Relator), do STF, sustentou que:

  1. A proibição total da realização de cultos religiosos presenciais representa uma extrapolação de poderes,
  2. A Constituição de 1988, estabelece um conjunto de garantias para que a liberdade religiosa possa ser exercida em toda a sua dignidade;
  3. Ao tratar o serviço religioso como não-essencial, Estados e municípios podem, por via indireta, eliminar os cultos religiosos, suprimindo aspecto absolutamente essencial da religião;
  4. No caso South Bay United Pentecostal Church v. Newson (592 U.S. __ 2021), a Suprema Corte dos Estados Unidos considerou legítima a restrição de público em cultos religiosos (tolerando a ocupação de até 25% da capacidade dos templos), mas considerou inconstitucional a proibição completa dos cultos religiosos.
  5. A proibição categórica de cultos não ocorre sequer em estados de defesa (CF, art. 136, § 1º, I) ou estado de sítio (CF, art. 139). Como poderia ocorrer por atos administrativos locais?
  6. Diversas atividades também essenciais, tais como o serviço de transporte coletivo, vêm sendo desenvolvidas ainda que em contexto pandêmico, demandando para tanto um protocolo sanitário mínimo que, com as devidas considerações, poderia ser também adotado no presente caso.
  7. Proibir pura e simplesmente o exercício de qualquer prática religiosa viola a razoabilidade e a proporcionalidade.
  8. Justamente por vivermos em momentos tão difíceis, mais se faz necessário reconhecer a essencialidade da atividade religiosa, responsável, entre outras funções, por conferir acolhimento e conforto espiritual.
  9. Destaco também o caráter filantrópico, promovido por tais instituições, sendo que muitas fornecem alimentação e abrigo à população mais carente (cuja necessidade mais se destaca no atual contexto) e que, além de concretizar a solidariedade, preceito fundamental do art. 3º da Constituição, é elemento essencial para enfrentarmos os reflexos da pandemia.
Portanto, com essa liminar é possível retornar os cultos em todo o território nacional. Após essa liminar, o plenário do STF pode cassar a decisão do Relator. Vamos aguardar os próximos capítulos.

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